Com a palavra: João Carlos Lima de Oliveira, gestor do Parque Estadual do Ibitipoca


João Carlos Lima de Oliveira, gestor do Parque Estadual do Ibitipoca
João Carlos Lima de Oliveira, gestor do Parque Estadual do Ibitipoca

O Parque Estadual do Ibitipoca (MG), criado em 1973, é um dos parques mais conhecidos e visitados de Minas Gerais. Em 2015, mais de 95 mil visitantes passearam pela Unidade de Conservação. Tanta fama não é à toa. Em seus 1.488 hectares de extensão, os atrativos da unidade de conservação incluem cachoeiras, piscinas naturais, trilhas, grutas, picos, mirantes e sítios históricos todos caprichosamente emoldurados pelas cores e paisagens da Mata Atlântica.

No final de outubro, entretanto, a Janela do Céu, um dos cartões-postais do parque  teve sua visitação suspensa. O gestor da Unidade, João Carlos Lima de Oliveira explica que a medida é temporária e se fez necessária para garantir a segurança da atração, tanto para os visitantes quanto para preservação do local.  Apesar de ainda não haver previsão para o retorno das atividades na Janela do Céu, todos os outros atrativos do parque seguem normalmente abertos à visitação. Quem planeja uma visita em breve não precisa se preocupar.

Com trinta anos de experiência em gestão de unidades de conservação, o biólogo está a frente do Parque Estadual do Ibitipoca há 12 anos. Orgulhoso do legado de seu trabalho na unidade, que concilia a conservação da biodiversidade com o uso público consciente, ele diz que “ter uma unidade de conservação conservada biologicamente e geologicamente, de acordo com os próprios pesquisadores, ao mesmo tempo em que há uma visitação intensa, é a nossa maior vitória”.

Confira abaixo a entrevista que o WikiParques fez com João Carlos Lima de Oliveira

WikiParques: O Parque Estadual do Ibitipoca é um dos parques estaduais mais famosos de Minas Gerais. Quais os principais atrativos e atividades dentro do parque?

João: Eu não vou nem falar que o Parque Estadual do Ibitipoca é o mais importante, porque eu acredito que todas as Unidades de Conservação têm a sua importância, independente do seu tamanho e da sua localização. Mas o Ibitipoca, aqui em Minas, é um dos mais conhecidos e o parque estadual mais visitado. Ano passado foram mais de 95 mil visitantes no parque.

A gente trabalha com três circuitos de atrativos dentro do parque. O primeiro, o Circuito da Janela do Céu, com 16 quilômetros, ida e volta, onde está o ponto mais alto do parque, o Pico da Lombada, com aproximadamente 1.800 metros e um ponto histórico-cultural que é o Cruzeiro. Além de grutas, como por exemplo a dos Três Arcos e a Gruta dos Moreiras; e o próprio atrativo Janela do Céu e a Cachoeirinha. O segundo, o Circuito do Pico do Peão, com 9 km, também oferece aos visitantes grutas, como a Gruta do Peão e a Gruta dos Viajantes, que é uma gruta belíssima. Além disso, tem o Pico do Peão, que é o segundo ponto mais alto do parque, com 1.700 metros, e é onde estão localizadas as ruínas da Capela de Bom Jesus da Serra. E, o terceiro, o Circuito das Águas que, talvez, seja o mais visitado dentro da unidade pela facilidade e por ter as águas, as cachoeiras e as piscinas naturais. São apenas cinco quilômetros e é um circuito muito tranquilo com vários atrativos: Lago dos Espelhos, Lago da Miragem, Cachoeira dos Macacos, Ponte de Pedra.

Dentro do Parque Estadual do Ibitipoca nós temos uma área de camping que funciona com aproximadamente 24 barracas. E, além de acampar, os visitantes possuem um leque de atividades como caminhadas, banhos de cachoeira e a própria contemplação da natureza. Estamos recebendo muitos visitantes, até estrangeiros, para observação de aves também. E tem muita gente que procura o parque pela observação da flora também, uma vez que o Ibitipoca possui uma vegetação muito rica e exuberante.

Recentemente, um desses atrativos, inclusive um dos mais famosos do parque, a Janela do Céu, foi fechado para visitação. O que provocou esta decisão?

O atrativo Janela do Céu é um atrativo muito pequeno [são 30m², de acordo com o adendo do Plano de Manejo], é uma cachoeira com um espaço curto, mas que recebe um fluxo de visitantes muito grande, especialmente em feriados prolongados e finais de semana. Nós decidimos fechar esse atrativo temporariamente para fazer um trabalho de intervenção e de melhorias que leve a uma maior segurança para o visitante nesse atrativo. Entre o atrativo estar aberto e agradar todas as pessoas, ou fechar o atrativo e não sermos entendidos por alguns, mas garantirmos mais segurança aos visitantes, essa é nossa escolha, porque esse é o nosso objetivo.

Nós não queremos que o visitante deixe de visitar o atrativo, de forma alguma. Mas queremos que ele visite com toda a segurança possível. Para isso, estamos fazendo uma série de estudos e levantamentos para realizarmos as intervenções de acordo com esses estudos e para poder reabrir o atrativo levando maior segurança ao visitante. O levantamento vai traçar o que é necessário: controle do número de pessoas que poderão visitar o atrativo por dia, guarda-corpos, mais funcionários. Se o estudo indicar que colocar só um guarda-corpo é a solução vai ser isso e vamos monitorar para saber se está funcionando. Ainda não sabemos quais serão as medidas porque os estudos ainda estão em andamento. Temos um grupo de voluntários, composto por especialistas em várias áreas, principalmente em segurança de uso público, e já começamos a conversar para, no menor espaço de tempo possível, reabrir esse atrativo dentro do parque.

O Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais informou, no final de outubro que 11 Unidades de Conservação do estado sob sua gestão estavam com a visitação suspensa. O Parque Estadual do Ibitipoca, apesar de também ser gerido pelo Instituto, não está nessa lista. Quais têm sido os caminhos e as soluções buscadas pela gestão do parque para driblar a falta de recursos e de funcionários para manter o funcionamento?

Eu costumo falar que gerir com recursos é muito mais fácil, gerir sem recursos que é o grande mistério da vida (risos). Para driblar isso, temos trabalhado muito com voluntários. Alguns funcionários abriram mão de suas folgas e algumas pessoas da comunidade vêm trabalhar no parque para nos ajudar. No feriado passado, por exemplo, estávamos com três servidores que disponibilizaram suas folgas de sábado e domingo e trabalharam para ajudar, e tínhamos mais cinco voluntários. Então conseguimos dar um atendimento à contento para os visitantes. Não é o nosso ideal ainda. O nosso ideal é ter toda a situação regularizada e voltar a pleno vapor trabalhando dentro do parque. Mas, atualmente, com esse problema da falta de funcionários, estamos contando com essas pessoas da vila que querem ajudar a gente.

Parque Estadual do Ibitipoca. Foto: José Luiz Grazia
Parque Estadual do Ibitipoca. Foto: José Luiz Grazia

Além desses voluntários de ocasião, existe alguma atividade regular de voluntariado dentro do Parque Estadual?

Nós temos um programa de voluntários com estudantes das áreas ambientais e turísticas. A gente abre uma seleção para 10 vagas, eles encaminham o currículo para gente, fazemos uma avaliação e trabalhamos com eles. Dia 2 de dezembro vai sair o próximo edital próximo, que começa em janeiro.

Esse é um programa mais regular, abrimos essas vagas nas férias escolares e nos feriados prolongados, como o Carnaval e a Semana Santa. Os voluntários ficam de 10 a 15 dias no parque, sob supervisão da administração do parque ou de algum funcionário da Unidade. O ideal seria ter essas pessoas o ano inteiro lá dentro, porque é bom para o parque e para o estudante também mas existe uma dificuldade muito grande do estudante se disponibilizar durante o período letivo. A procura é sempre muito grande. Na última edição tínhamos apenas 10 vagas e mais de trinta pessoas interessadas. Agora temos na nossa lista de espera do voluntariado um peruano e uma venezuelana. As pessoas realmente querem vir. Nesta próxima edição, vamos trabalhar com um número reduzido. Serão apenas cinco vagas, para que a gente consiga ter um acompanhamento mais próximo desse aluno.

Qual a importância desse voluntariado?

Esse voluntariado é importante para os dois lados. A Unidade de Conservação passa a ter uma mão de obra qualificada, pois são estudantes de biologia, engenharia florestal, agronomia, turismo. com uma gama de informações frescas da academia.  É também qualificação e experiência profissional para esses alunos. São dez, quinze dias dentro da Unidade, fazendo diversos serviços, não só acadêmicos: eles ajudam no atendimento ao público, no trabalho de portaria, na fiscalização e na própria limpeza de algumas estruturas, se necessário for. É importante porque o aluno ganha uma experiência importante de vivência dentro do dia a dia uma Unidade de Conservação.

De que forma a gestão do parque atua no estímulo ao uso público consciente e sustentável da unidade de conservação?

Nós fazemos todo um trabalho de interpretação e divulgação na Unidade para conscientizar os visitantes. Em nosso centro de visitantes, passamos todas as normas e a conduta adequada aos visitantes dentro da Unidade de Conservação. Mas o que percebemos nos últimos anos é que os visitantes, dada a facilidade de acesso à informação, vêm para o parque sabendo o que é uma Unidade de Conservação e como se portar dentro de uma. São pouquíssimos os casos de depredação por visitantes que temos dentro do parque.

Qual a importância de projetos de pesquisa em Unidades de Conservação em nome da preservação dessas áreas e, em especial, no Parque Estadual?

Este ano nós estamos com 35 projetos de pesquisa autorizados dentro do parque, em diversas áreas: fauna, flora, educação ambiental, uso público. Existe uma diversificação muito grande de pesquisas na Unidade e várias instituições também. Óbvio que as instituições mais próximas do parque, como a Universidade Federal de Juiz de Fora (MG), têm um número maior de pesquisa, mas várias universidades e instituições do Rio de Janeiro e de São Paulo, e até de outros lugares de Minas Gerais, desenvolvem trabalhos de pesquisa dentro do Ibitipoca.

A pesquisa é de suma importância, porque são os pesquisadores que falam para nós, gestores, o que existe realmente na unidade, em termos de biodiversidade, e em qual condição está. Com essas informações podemos traçar um plano de trabalho para conservar essa biodiversidade, que é o ponto-chave de uma Unidade de Conservação. Em apoio a estes pesquisadores, disponibilizamos funcionários para fazer o acompanhamento, além de alojamentos para permanência deles no parque.

As águas das cachoeiras de Ibitipoca. Foto: José Luiz Grazia
As águas das cachoeiras de Ibitipoca. Foto: José Luiz Grazia

Quais são os principais desafios e conquistas da gestão do Parque Estadual do Ibitipoca?

Eu acho que a minha maior conquista é o reconhecimento das pessoas. Em 2004, tínhamos em torno de 23 mil visitantes. Hoje temos em torno de 95 mil e este ano provavelmente chegaremos aos cem mil visitantes. E se as pessoas estão vindo é porque o ambiente está propício a ser visitado, está conservado. Ninguém vai visitar um lugar feio, um lugar degradado. Se observarmos imagens de satélite, conseguimos ver como o ambiente no Parque Estadual do Ibitipoca se recuperou nesses últimos anos devido à própria regeneração natural e também às atividades de reflorestamento e manejo que nós fazemos dentro do parque.

Ter uma Unidade de Conservação com mais de 40 anos conservada, biológica e geologicamente, de acordo com os próprios pesquisadores, ao mesmo tempo em que há uma visitação intensa, ou seja, ter o uso público e a conservação conciliados –, que é a coisa mais importante de uma unidade de conservação –, é a nossa maior vitória.

Eu acho que o desafio é que daqui há dez, cinquenta, cem anos, esteja neste nível ou melhor. Um desafio que vou deixar para os próximos gestores também, porque, logo logo, estou me aposentando e serei só um turista dentro do parque. O que temos que fazer hoje é entregar e passar essa bola para frente com um parque bem estruturado, bem conservado e bem visitado.

Em 2013 fomos avaliados como o terceiro melhor parque da América do Sul pelo Tripadvisor [site de turismo e viagens]. E esse ano nós recebemos um prêmio de gestão ambiental [Prêmio Top of Quality Brazil]. Esse reconhecimento da sociedade e dessas instituições é fantástico.

Muitos parques ainda não foram abertos à visitação. Gostaria que você comentasse um pouco mais sobre a importância do uso público em Unidades de Conservação.

Quando você tem uma Unidade de Conservação, para abrí-la ao uso público, você tem que ter uma infraestrutura mínima: funcionários e estruturas físicas, como banheiros públicos, administração e centro de visitantes. Sem isso, você pode levar perigo para o próprio visitante ou você pode ter um visitante que sem informações vai causar prejuízo àquela Unidade. E muitas das Unidades de Conservação que temos, não só em Minas Gerais, mas no país todo, estão carentes dessas estruturas. Nesses 30 anos em que estou no Instituto Estadual de Florestas, sempre envolvido com Unidades de Conservação, e percebo que o Estado tem investido, mas óbvio que a gente sempre quer um investimento maior. Por essa falta de recursos e infraestrutura que muitas unidades ainda não foram abertas ao público oficialmente.

Em outros países se dá uma importância muito grande à unidades de conservação. Eu acho que o povo brasileiro tem que passar a conhecer mais as suas. Elas ainda são pouco visitadas. As pessoas têm que visitar e cobrar dos gestores as melhorias que falamos aqui, porque fazê-las é obrigação nossa, do Poder Público. Para oferecer mais parques abertos ao público e receber cada vez mais gente do nosso país nas nossas Unidades.

 

 

 

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